9 de jan. de 2020

Austeridade

Aproveitei o ano novo para te escrever novos versos
Nem que seja apenas para reiterar mais do mesmo
É que eu sou melhor com as palavras planejadas

No improviso, as vezes eu erro o tom, o jeito, o tempo,
Erro até mesmo a frase toda ou cometo excessos literários,
No calor da emoção, eu fico todo torto, me desespero

Nem sempre consigo conter esse turbilhão de sensações
É medo de falhar, de ser esquecido, de te fazer mal, enfim
Por isso escrevo assim, sem rima, sem ritmo, apertado
Que é como o coração ficou quando você partiu daqui

Mas eu sei que você precisa ir cuidar do teu reino
Eu sei das suas batalhas, eu conheço as suas lutas
Queria eu conseguir ser âncora para todos os ventos
Mesmo de longe e mais ainda quando perto

E que pena que fico bem menos perto do que longe
Que a saga do tempo me permita mudar essa rotina
Mais campainhas tocando, menos quilômetros de distância
Mais "pode subir" ou "fica" e menos check-ins de voos

E eis que você decide ficar e até minha rima volta
Mais rápido que rede wi-fi o seu riso bate a porta,
Porque fazer sorrir é tipo magia, é quase um dom,
Cada suspiro flui no ritmo da velocidade do som

Quando entendi que não era fugaz, confesso que hesitei,
Sempre soube que seria áspero, hoje em dia, nem sei
Mas evitar algo tão precioso seria imensa covardia
Cada dia mais, sinto que achar você foi ganhar na loteria.

31 de out. de 2019

Volta

Assim que tranquei a porta e saí da pousada na Rua Mangaba,
Senti meu peito mais turvo e gelado que a Cachoeira do Segredo
Como se meu coração tivesse ficado para trás, em alguma trilha,
Em alguma estrada, na risoteria de ontem ou na noite estrelada

A cada degrau que eu descia com a mala, mais longe eu ficava
Mais xoxo, menos sereno, mais o peito outrora radiante apertava
Como eu posso ir agora, se a gente ainda nem subiu na torre de lá?
Aliás, ainda há tanto lugar pra gente subir e tanto para se explorar

Entrei no carro querendo emanar boas energias de todos os cristais,
De todos os bons espíritos, os bons ventos, todos os santos e orixás
Se até a lua tem fases e fica minguante só para as estrelas luzirem mais,
Eu prefiro acreditar que logo a gente espanta esses infernos astrais

Escolho lembrar de você flutuando nas águas cristalinas de Santa Bárbara
Do restaurante da volta, do seu gozo, o bolo de chocolate, o pão de abóbora,
Dos desejos de voltar em breve, de ganhar na sena e ter uma chácara
Eu escolho confiar que logo volta a soar o seu canto e o seu riso

Enquanto esse dia não chega, toca aí a playlist que eu fiz pra você.

17 de out. de 2019

Imprevista e insana

Desde o primeiro passo em seu costumeiro lar,
Me senti como se estivesse exatamente
No único lugar onde realmente deveria estar
E pouco me importava se era Jaó ou Marista
Se era sobrado ou kitnet, no escuro ou no claro,
No sofá da sala ou entre as almofadas do quarto
Só queria passear pelas curvas do teu bosque
Até que a passarada anunciasse o amanhecer
E poder voltar no dia seguinte, desacelerado
Medir e sentir delicadamente palmo a palmo
Depois forte, depois lento, depois sóbrio
Deslizar em teu corpo embaraçado a finas teias
E te apresentar minha alma que sente e vibra
Nem que seja só pra desmistificar as causas vãs
E te ajudar a recolher as folhas secas da varanda,
Os discos furados e todos estes cacos na cozinha
Eu sei que carrego um lado torto e outro corcunda,
Mas deixa eu jogar fora toda essa lama imunda?
Vim enaltecer sua força inquieta, imprevista e insana
Que me trouxe de volta o coração ardente e em chama
E agora? Eu fico? Por que ir daqui, se é tão bom ficar?
Se a vida é mesmo essa rude aventura passageira,
Por que chorar tortuosamente, se o tempo não volta?
Pra que se o "não" é sempre o que mais passa ligeiro?
Melhor mesmo é curtir contigo cada nota desse canto
Ou jogar Desafino em uma exausta tarde de domingo
Seja na praia ou cachoeira, Pinheiros ou Ipiranga
Planejando a próxima viagem ou lembrando da última
Quer ficar e contar comigo as esquinas do caminho
Até a gente perder a conta e a vontade de contar?
Não sei quantos quilômetros tem a nossa estrada
Tampouco, sei qual é a velocidade máxima permitida
Mas desse lado da janela, vejo ipês e mudas novas
Vejo nuvens desenhadas, céu azul e águas calmas
Nenhuma placa de Stop ou de curva sinuosa
Sigamos assim, como um pincel traçando obras novas.

21 de ago. de 2019

Das 5 às 9

Eu que fiquei dias a contar segundos
Verbalizando os mais tortos escritos,
Os mais quentes e os mais intensos que vivi,
Agora não vejo a hora de ouvir teus áudios
Saindo direto de tua boca desejando a minha

E, de olhos inebriados, peço aos que me ouvem
Que você continue desejando amanhã de manhã
Mais ainda, que a vontade aumente no tardar do dia
E que os momentos seguintes sejam de fogo e volúpia
Ainda que o hiato sem teu gosto venha logo em seguida

Das 5 às 9, os minutos parecem poucos, quase nada
Ademais, eu trocaria meses de vida por cada sorriso assim,
Por cada um desse levantar de sobrancelha e cada gozo seu
Abriria mão de eternos para viver ao seu lado instantes
Ainda que seja só pra ouvir esse "eu te gosto", que soa falso

Esse mês durou enormes semanas vazias, mas amanhã cessa.

4 de ago. de 2019

Loiros

Hoje, de novo, pensei nos seus loiros e
Desejei encontrar alguns fios no travesseiro
Depois no carro, na comida, no banheiro
Quis entrar nas suas fotos publicadas
Todas tão distintas, tão elogiadas,
Só para fitar de perto suas curvas,
Suas lutas, suas rotas e te roubar pra mim
Queria eu te levar pro mundo,
Caminhar contigo pelas calçadas,
Pelas avenidas, pelas madrugadas
Te mostrar o Empire, o MoMA, o Guggenhein,
Já que me falta o juízo, eu podia ter, ao menos, a sorte
De descer seu corpo do Upper a Dowtown
Cruzar a ponte e voltar de novo
Até você ficar realizada, até se cansar
Te fazer musa, like a Hollywood superstar
E também sair comigo, assim que eu voltar
Não mordo, não te ataco, eu hei de aguentar
Ah, loira, mais bela que a vista do Top of the Rock
Vou pôr seu nome nas marquees da Broadway
E depois, debaixo do meu lençol, do meu teto
Enfim, não custa sonhar, anyway, eu sei.

29 de jul. de 2019

Quisera eu

Ah, linda moça, eu fico querendo, mas tenho receio de ir te falar
Vai que está ocupada ou dando risada com alguém acolá
Mas quando eu bebo uma dose, arranjo coragem pra te procurar
Arrisco, digito intenções, falo qualquer bordão pra te impressionar

Você me dá um barato do balaco baco, que nem ácido deu
Quisera entender esse lance, se vai virar romance, quisera eu
Chamei pra armar um esquema, mas você cansada pediu pra pensar
Nem acreditei, quando o celular apitou com você dizendo, que ia se arrumar

Ah, me perdoa, é que contigo, o tempo voa
Já são 5 da manhã, essa nossa embriaguez destoa
E se eu acordar, sei que vou estar rindo à toa, à toa

Ah, me perdoa, é que contigo, a direita esquerda
Acabei de chegar em casa, mas bem que queria estar na sua
Amanhã já chegou, que sonho bom.

14 de dez. de 2015

Menos nós

Tenho saudade do tempo, quando tinha menos nós
Do tempo que gente não valia mais que bicho,
Que prédio não valia mais que árvore,
Que lua valia mais que LED
E todo mundo via o outro.

Que bom o tempo que tinha menos nós.
Que bom o tempo que éramos menos sós.

10 de dez. de 2015

Tristeza triste

A tristeza é triste.

Durante toda a noite, me veio uma tristeza, que nem as maiores alegrias conseguiriam anular. Tentei cerveja, video game, filme, loteria... Tentei trabalho, tentei academia, tentei dar voltas pelo quarteirão... Nada foi capaz de espantar essa vontade do choro. E o pior é que nem chorar eu pude. Ajoelhei perto da cama, pensei nos maiores dramas da humanidade, mas o choro não veio. Que tristeza triste é essa, que nem a lágrima faz cair?

Liguei, mandei mensagem, parece que não me ama mais, sei lá. Vai ver, amanhã chega com o abraço maior do mundo e parece que nada aconteceu, parece que a tristeza nem veio, foi só noite mal dormida, só sonho ruim de segunda-feira pós férias. Mas não, a tristeza é triste.

E como é que tristeza há de ser feliz afinal? Tem tempestade que precede o céu azul. Tem tempestade, que é só tempestade mesmo. Vem em noite de festa, molha os sapatos, estraga o penteado, elimina o perfume e vai embora só de manhã, deixando o domingo cinza. Quer coisa mais triste que domingo cinza?

A vida é epopeia anunciada. Sem heróis, sem glórias. Você é tão bom quanto o dia de ontem.

14 de jul. de 2014

Sexta, sábado, domingo

Acordei e fui testemunha de um céu lisérgico
Desses que nem a cortina quer esconder
Tinha dormido bem e era sábado,
Mas a cama vazia dava o tom de cinza
Cinza quase castanho, o azul desbotou
Minha mão tateou o vácuo, despertador tocou
Tinha mensagem sua, de texto, de voz
Sem teu corpo ali do lado, ao menos dados
Justo hoje que eu queria fatos e fotos
Sempre quero, coleciono prints de você
Preferiria colecionar abraços sem partida,
Breves retornos, beijos sem despedida
Nesse romance à prazo, aceito pagar à vista
Veio a quinta, é só amanhecer pra você chegar
Sábado volta a ser sábado e o domingo azul
Semana que vem é triste, você não vem
É tempo do azul virar cinza e o sábado domingo.

9 de jul. de 2014

O festival

Foi em 2011, mas tanto faz,
Podia ter sido 2008 ou 7
Naquele festival de cinema,
Foi a melhor cena que eu vi

E não estava em nenhum filme
Não disputou nenhum prêmio
Pode até ter escapado das lentes,
Mas meus olhos captaram em 24 frames

Virou um belo plano sequência, one shot
Um take e já merecia até tapete vermelho,
Leão em Cannes, Urso em Berlim

Passei os próximos anos querendo um remake
Tentei, mandei roteiro, não vinha
Não tinha disponibilidade a atriz principal

Escrevi outro plot, criei outro shot
Suspirei quando aceitou fazer meu filme
A musa veio, produzi e filmei. FICA?